Tive uma infância maravilhosa. Muito mesmo. Minhas duas famílias me proveram vivências que acredito ser oportunidade de poucos. A família Aragão tem ( ainda hoje) uma casa na ilha de Itaparica que era o verdadeiro paraíso para mim e mais de 15 primos, todos na mesma faixa etária. Naquela época o lugar era ermo, e vivíamos livres para colorir nossas aventuras. A família Bastos dispunha de um sítio, mais conhecido como Chácara Chico Mendes, na cidade de Serrinha, interior da Bahia. Lá a gente tirava acerola do pé, brincava no balanço da mangueira, fazia fogueira, criava pintinhos e galinhas. O sítio já foi vendido, mas a memória dele ainda é muito viva em todos nós. Nessa cidade ainda mora o meu tio querido, Fernando, mais conhecido como Capilé. Amante das palavras (escreve coisas belííííssimas) e da boa música Nordestina, muito do que trago na minha bagagem sofreu larga influência dele. Me lembro dele cantando pra mim, eu era muito, muito pequena, uma música do Geraldo Azevedo, que não lembro exatamente qual. Mas lembro dessa cena onde ele me cantava e explicava a letra, o que ela estava transmitindo: "Entendeu Lancoca?". Eu ouvia atenta. E é esse o som que tenho registrado na minha cabeça fortemente como o som da minha infância. Esses embalados pela voz do Geraldo. Acho que ficava tocando lá no sítio enquanto a vida acontecia e ficou uma coisa meio subliminar. Mas é ouvir qualquer canção na voz sotaqueada desse Nordestino sem igual, para que eu me transporte direto praquele lugar. Posso sentir o cheiro do fifó, do candeeiro da casinha do caseiro, que quando esse não estava, virava casinha das crianças. O gosto ímpar do geladinho da véia Edite. Sinto até as palmadas carinhosas que seu Erasmo dava no meu bumbum: "É Lori!!!". Não há um show que eu assista do Geraldo Azevedo que não me emocione. Já virei até piada dos meus amigos. Todos os shows fico altista. Não converso com ninguém, não olho para ninguém. Não tem como. Eu não estou alí, estou me balançando debaixo da árvore, vento no cabelo, coração de criança. A voz desse cantor vai além do meu coração, suas músicas me projetam pro melhor de mim. Hoje, adulta, vivendo no Rio de Janeiro, acabei de chegar da casa dele, Geraldo Azevedo. Eu estava na casa dele. O valor que isso tem para mim, ninguém calcula. Fico pensando em como o Capilé gostaria de estar alí, como eles se dariam bem, certamente. Por conta dessas coincidências ( será?) da vida, acabei criando amizade com familiares do Geraldo que me proporcionou essa vivência. Aqui no Rio, já tive oportunidade de ir há vários shows, acesso a camarim, foto e tudo mais. Nunca tive coragem de chegar perto dele. Minha mão sua, coração acelera... Aí eu desisto. Mas hoje, não resisti. Estava tudo tão a vontade, ele alí, dentro de casa, comemorando a vida de sua filha, tranquilo, sereno.Eu, morrendo de vergonha, mas pedi ao meu amigo que falasse com ele, o que foi feito na maior tranquilidade e simpatia. Eu, suando mais que corredor de maratona, pensei mil coisas pra falar, dizer o quanto aquele momento me era especial... Nada. Não veio nada. Engasguei, tentando fazer "a natural" pra não pagar mico numa festa particular. Mas tudo bem, agora já estou satisfeita e muito. Queria dedicar esse post ao Capilé, agradecer a ele pela boa influência e dizer que sim, eu entendi, tio
"La paz, el amor, la verdad. Presente amanhã, coração. A paz, o amor, a verdade. Presente Mañana, corazón".